Acordou cedo e os filhos ainda dormiam, Cuidou dos animais de estimação, que muitos brincavam de poucos cuidavam. Lavou algumas louças e começou a fazer o café. Passou pelo quarto, antes deles, e viu a cama vazia. A ausência já não foi tão significativa. Nas fases que não duravam muito tempo, saía cedo. Por algum tempo, participou de maratonas, depois de trilhas de moto (mesmo quando ela quando os filhos eram pequenos, mesmo no período em que ela passava por cirurgias seguidas, depois de um erro cirúrgico que lhe custou mais seis cirurgias). Saía se, dizer o destino, raramente ligava para casa e voltava a hora que bem entendia. Naquele tempo, aguardava sua chegada com ansiedade com receio de que lhe acontecesse algo.
Sua angústia, sem direcionamento e escuta, era recebida como queixa. Ele precisava “relaxar”. Se envergonhava de reclamar quando saíam para algum evento com os filhos, e ele se encharcava de bebidas alcóolicas, enquanto ela cuidava das crianças. Por muitas vezes, voltava para casa alcoolizado. A submissão e o medo da agressividade estimulada pelo álcool, seguia, chorando em silêncio para não abalar os filhos.
Retornando ao domingo, depois de duas décadas e oito anos, os filhos acordaram, marcamos de fazer um passeio em família em uma parque municipal. Primos, irmã e filhos. Seu organismo não correspondia, a cabeça doía e angústia (dor no plexo cardíaco), não passava.
Cometera o erro de não ter uma carteira de habilitação. Trabalhando dois horários e cuidando dos filhos, suas prioridades já não contavam. Como éramos quatro, teríamos que chamar dois carros. Depois que separamos, é preciso repensar os gastos, sempre apertados.
Um dos filhos, resolve chamar o pai. Ela se recusa e escuta: “Mas, ele é meu Pai também!” Lembrou-se que mesmo entre os equívocos, sempre procurou manter-se no papel de mãe, estimular a aproximação dos filhos para que o pai, precariamente, cumprisse seu papel, considerava saudável.
Recuou e disse que não iria: “Está tudo bem!” Dobrava as roupas do varal, seu outro filho a procura e diz: “Vamos, mãe! Podemos chamar um Uber!” Insistiu, alegou pressa. Ela precisava se arrumar. Pensou em passar o dia com eles, arrumou-se. Vestido vermelho, um pouco de maquiagem para esconder a tristeza . Surpresa, sua filha chega e lhe diz que chamaram o pai. Ascendeu, e novamente disse que não iria, estava tudo bem. Não estava.
Saíram. Sozinha, acabou de guardar a roupa e chorou. Tentou rabiscar algumas linhas sem vontade. Pediu o almoço, sem nenhuma fome. Tomou uma taça de vinho e ligou a televisão. Os pensamentos eram confusos, a solidão era real. Por todo esse tempo, sem tempo, afastou-se dos amigos. As horas passaram lentas, nenhuma mensagem ou telefonema.
Deu-se conta da sabotagem que lhe reservara. A TV, os livros, o computador, os escritos, a casa. Procurou dormir para que as horas passassem depressa.
Marcou com sua cunhada para conversar, todavia não sabia o que dizer. Desmarcou. Deitou-se, tomou um ansiolítico e dormiu. Acordou as 23h e verificou se os filhos estavam em casa.
Não sentia fome. Os olhos fundos, ardiam. A mesma angústia, a mesma cama, e o silêncio.
Mais um ida, menos um dia!
Sentir era o que lhe abundara, aliado a esperança de que um dia conseguiria preencher o vazio, esse que, sem perceber, tornou-se frequente.